Daniel Malet Calvo (PhD) CIES-IUL (ISCTE)
A GÉNESE TRAUMÁTICA DO PATRIMÓNIO EM LISBOA: SÍMBOLOS E REPRESENTAÇÕES URBANAS NOS BAIRROS TÍPICOS DEPOIS DO TERRAMOTO DE 1755.
Resumo: Os processos de patrimonialização no bairro lisboeta da Mouraria estão a ser articulados, em grande medida, pelos discursos institucionais centrados na evocação historicista. O elemento do Fado está no eixo destes processos de imaginação urbana que encenam tradições e memórias, num processo de simbolização circunscrito num território urbano específico: os Bairros Antigos e Típicos de Lisboa. As suas densas malhas urbanas, as modalidades de socialização “bairristas” marcadas pela extrema familiaridade entre vizinhos e pelo orgulho da identidade microlocal, explicariam a “genuinidade” e a “autenticidade” atribuída às suas produções culturais. Mas o reconhecimento do fado como património imaterial pela UNESCO e a sua utilização nos processos de transformação urbana hoje na Mouraria são só o fenómeno mais visível duma comprida história de caracterização simbólica dos bairros antigos. A semiótica que sustenta o imaginário social da bipolarização entre Bairros Antigos e Novos, entre a Lisboa Moderna e a Lisboa Tradicional ou Típica, tem a sua origem na evolução da forma urbana da cidade posterior ao Terramoto de 1755. Só com a reconstrução do centro da cidade e os posteriores abalos políticoculturais do romantismo aparecem as condições de possibilidade para pensar uma Lisboa Típica. Como é que foi criada e reproduzida ao longo do tempo a noção de autenticidade urbana dos bairros antigos?
Palavras-chave : Terremoto de 1755, Baixa Pombalina, Bairros Antigos e Típicos, Fado, Patrimonialização.
LA GENESE TRAUMATIQUE DU PATRIMOINE A LISBONNE : SYMBOLES ET REPRESENTATIONS URBAINES DANS LES QUARTIERS TYPIQUES DEPUIS LE TREMBLEMENT DE TERRE DE 1755.
Résumé : les processus de patrimonialisation dans le quartier lisboète de la Mouraria sont articulés, dans une grande mesure, par les discours institutionnels centrés sur une évocation historiciste. L’élément Fado constitue l’axe de ces processus d’imagination urbaine qui mettent en scène traditions et mémoires, dans un processus de symbolisation circonscrit dans un territoire urbain spécifique : les Quartiers Anciens et Typiques de Lisbonne. Ses denses mailles urbaines, les modalités de socialisation « bairrista » (mot qui en français signifierait : dans l’esprit propre du quartier) marquées par m’extrême familiarité entre voisins et par la fierté de l’identité micro-locale, expliqueraient « l’originalité » et « l’authenticité » attribuées à ses productions culturelles. Mais la reconnaissance du Fado comme patrimoine immatériel par l’UNESCO et son utilisation dans les processus de transformation urbaine aujourd’hui dans la Mouraria n’est que le phénomène le plus visible d’une longue histoire de caractérisation symbolique des quartiers anciens. La sémiotique qui porte l’imaginaire social de la bipolarisation entre Quartiers Anciens et Nouveaux Quartiers, entre une Lisbonne Moderne et une Lisbonne Traditionnelle ou Typique, trouve son origine dans l’évolution de la forme urbaine de la ville après le tremblement de terre de 1755. C’est avec la reconstruction du centre de la ville et les secousses politico-culturelles du romantisme qui suivirent, qu’apparaissent les conditions de la possibilité de penser une Lisbonne Typique. Comment fut cultivée et reproduite, tout au long du temps la notion d’authenticité urbaine des quartiers anciens ?
Mots clés: tremblement de terre de 1755, Baixa-Pombalina, Quartiers Anciens et Typiques, Fado, patrimonialisation.